Thursday, November 13, 2008

Mudar o Porto

«A cidade: por onde fores, ela irá». Estes versos do poeta grego Konstandinos Kavafis evocam a condição de cidadão e habitante da polis – transportaremos os valores e princípios da cidade onde quer que estejamos, qualquer que seja o nosso trajecto. O que nos leva então para fora dela? Porque não a reconhecemos e não nos reconhecemos nela? O que acontece quando esses valores e princípios se degradam? Quando a cidade perde legibilidade e carga identitária? Quando a cultura na e da cidade é vista como inimiga a abater? Quando a arte e o quotidiano se dissociam? Quando a mobilidade é um direito cada vez menos partilhado? Quando a vida e a expressão se desvitalizam? Quando uma anomia implosiva nos faz ter medo da cidade limitando-nos aos espaços protegidos de consumo? Quando a mistura social é cada vez menos frequente, empobrecendo a diversidade nos e dos espaços públicos? Quando as políticas de habitação expulsam largas franjas da população dualizando o tecido social? Quando a cidade se fecha à articulação com territórios mais amplos? Quando a sustentabilidade é uma miragem que encarece a dívida para com as gerações vindouras? Quando a participação é vista como ataque e escarnecida? Quando nos roubam a memória e os espaços dos afectos e das relações? Quando o poder instalado odeia o conhecimento, a crítica e a insurgência? Quando a «cidade comum» se desagrega, frágil, aos nossos olhos? 

A cidade que de que falamos não é uma cidade qualquer. É a nossa cidade. É do Porto que falamos. É de nós que falamos. 

É negligência cívica adiar por mais tempo a construção de uma imagem de clareza e de justiça e enfraquecer a vitalidade de uma alternativa. 

É negligência cívica adiar a urgência de propostas que reinventem a participação nos processos de decisão, desde a formulação e aplicação de orçamentos até à definição das grandes intervenções urbanísticas e ambientais. 

É negligência cívica adiar a acção descentralizada e pluridisciplinar ao nível das freguesias e dos bairros. 

É negligência cívica adiar um projecto de internacionalização da cidade que se quer simultaneamente identitária e cosmopolita, firme nas suas raízes mas aberta à interpelação da diferença social, de género, de etnia e orientação sexual – uma cidade de cidadãos e cidadãs do mundo a partir daqui e de agora. 

É negligência cívica adiar o resgate da cidade plural e popular, inclemente com os poderosos, amiga do emprego e dos serviços públicos, solidária e redistributiva. 

Os signatários apelam ao envolvimento de todas e todos num profundo processo de mudança e de ruptura com os interesses há muito instalados e com o conservadorismo persecutório e clientelar. A re-apropriação da cidade pelos cidadãos tem que obedecer a uma nova lógica de partilha de recursos, de pensar a cidade no diálogo e tensão crítica entre as pessoas e entre estas e o território que habitam. 

Sem se considerarem detentores de qualquer verdade, convocam os cidadãos e cidadãs do Porto, portugueses e estrangeiros, a assinarem este manifesto que desaguará brevemente numa ampla reunião plenária e posteriormente num fórum de debate e concretização duma alternativa justa, solidária e insurgente. 





2 comments:

Ines Duarte said...

E é por isso que nós as duas subscrevemos o manifesto (à força).

"Foi bonita a festa pá!
Fiquei contente...
Ainda guardo, renitente, um velho cravo de jardim!"

Inês Carvalho said...

é verdade é verdade, subscrevemos sem o saber... mas wherever... é por uma boa causa!

POORTTOOOOO!!!